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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Afinal, o STF é um tribunal político ou jurídico ?

Há um questionamento interessante, muitas vezes trazido como crítica ao Judiciário, dizendo que o STF é um tribunal político, e não jurídico.

Isso leva a outras questões - normalmente não respondidas: existe uma diferença entre Política e Direito ? O que é Política ? Se existe a diferença, é possível dizer que um é "melhor" que outro ? Se o STF é político, as outras cortes e juízes não são ?

Sobre o conceito de Direito, já tracei algumas linhas [vide: o-sempre-discutido-conceito-de-direito](pretendo aprofundar isso no futuro), por isso o interesse agora é debater um pouco a ideia de Política.

De início, é algo quase evidente que Política não se confunde e não se reduz aos Partidos Políticos, sendo algo que permeia todas as relações. O senso comum não aceitaria dizer, por exemplo, que a atuação dos sindicatos nas greves não seria algo "político". Portanto, a noção de Política não pode deixar isso de lado.

Um dos conceitos usuais liga a Política à esfera de ação que busca conquistar e manter o poder superior dentro de uma comunidade (Bobbio). Parte do pressuposto da divisão entre os tipos de poderes (econômico, ideológico e força física) e que a possibilidade de usar a força policial e exércitos seria o maior poder [interessante como a imagem das forças armadas tomando as comunidades no Rio para implantação das UPPS reflete, em certa medida, esta noção de poder].

Mas será que esta redução do Político ao uso potencial das forças armadas é suficiente ?  Seria correto deixar de fora todas as demais ações sociais ? Voltando à política partidária, será que, por exemplo, a disputa presidencial entre Dilma e Serra era para ver quem ia ser o comandante das forças armadas ?

A resposta quase evidente destas perguntas mostra a insuficiência desta noção e leva à necessidade de aprimorá-la.

Olhando de novo a relação entre Política e Poder, lembra-se da percepção de que as relações poder existem onde houver ser humano. Dentro da família, na escola (professor vs. aluno; alunos vs. alunos; professores vs. funcionários, etc.), nas empresas, órgãos burocráticos, dentro dos próprios partidos; ou seja, cada microcosmo da Sociedade reflete algum tipo de relação de poder, que é algo fluido, exercido em cadeias, às vezes explicitamente, às vezes de forma sutil (Foucault). O poder nada mais é do que capacidade que um sujeito ou grupo de realizar a sua vontade, influenciando, condicionando ou determinando o comportamento de um ou mais pessoas (Bobbio).

Porém, não é apenas o exercício do poder físico. Caso contrário, teríamos que admitir que um assaltante está realizando Política, e não um ato ilegal e imoral [como sugere o senso comum, o crime não é uma ação política, mas se isso é, ou não, ilegal ou imoral, vale um post, ou uma dezena de posts].

É necessário algum tipo de legitimação deste poder, que pode ser um princípio democrático, o carismático (religioso, por exemplo) ou outro qualquer.

Será que bastaria ligar um princípio de legitimação deste poder para torná-lo político ? Abordei um pouco disso em outro post [vide: hipotese-cinica ], mas só isso seria insuficiente. Afinal, a máfia, bem ou mal, também usa de princípios com aparência de moral (família, lealdade etc.) e não se pode atribuir o caráter de ação política às suas operações.

Olhando o fato de que o senso comum também acharia estranho falar em política quando do exercício de uma relação de poder entre dois indíviduos, começa a ficar claro que a noção de Política envolve não só o Poder e o princípio de legitimação, mas também um grupo social. Assim, é possível falar em política dentro de uma empresa, de um sindicato e de uma Nação. Nesta linha, a relação entre indivíduos está no âmbito da Ética (moral), a relação entre indivíduo dentro de grupos, na esfera da Política (ação social).

Esmiuçado o conceito de Política, ao se examinar a questão inicial (o caráter do STF), parece ficar clara a resposta de que, quando o STF resolve processos que tenham eficácia sobre grupos sociais (em "juridiquês": ações com efeito erga omnes como ADI, ADC, ADPF, etc; ações individuais com reflexos gerals- RE com repercussão geral -, etc.), fica claro o caráter Político - com "P" maiúsculo - de sua decisão, ainda que o racicínio da Corte naquele caso seja a simples aplicação de um dispositivo legal (em juridiquês: a mera subsunção com interpretação literal). [Aliás, a aplicação literal de dispositivos de lei sem construção normativa nenhuma seria uma opção política clara de deferência ao Poder Legislativo].

Seria possível extrapolar isso para julgamentos individuais ? Se imaginarmos que a Corte dará prevalência aos seus próprios precedentes - tal como faz a US Supreme Court - então a conclusão lógica é que aquela decisão individual reflete uma opção que será permanente (ou eterno enquanto dure, risos) e, com isso, é uma decisão não só jurídica, mas também política.

Uma questão isso levanta  é se isso não representa uma absorção do jurídico pelo Político. Em outras palavras: existe mesmo uma diferença entre Direito e Política ? Aí o tema vale outro "post" completo...

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Caro Artur, acho que o post sobre a Hipótese Cínica aborda isso, dê uma olhadinha lá: http://ajusticaodireitoealei.blogspot.com/2011/10/hipotese-cinica.html

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