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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Vale a pena estudar "Justiça" ?

Às vezes, pessoas mais pragmáticas podem perguntar-se: existe alguma utilidade em estudar um tema como "Justiça"? Ela gera alguma consequência prática? As divergências sobre o assunto não geram uma discussão sem fim? Não seria possível julgar os processos apenas com base no Direito?

A primeira resposta é a de que, se o tema vem sendo discutido há séculos, alguma importância ele tem para as pessoas; logo, esclarecer - ainda que não resolva - um tema a que as pessoas entendem relevante já é uma utilidade prática.

Outra resposta, no plano da Política, é que a ideia de Justiça é um valor e, como tal, mobiliza as pessoas. Uma concepção liberal mobilizará a ação para atingir objetivos liberais. Uma abordagem social, porém, gerará ação em sentido diferente. Assim, a discussão sobre o tipo de Justiça que se busca numa determinada Sociedade é um tema relevante e gera, sim, ações e resultados diferentes no plano político, isto é, no campo da convivência entre as pessoas de uma comunidade.

A terceira resposta, agora ligada ao Direito, é que, muito embora seja discutível a relação ou independência entre as esferas da moral, política e direito (abordei rapidamente o tema em post anterior e pretendo retomar isso no futuro), a verdade é que, mesmo se formos atentar única e exclusivamente ao direito legislado, há várias referências ao termo "Justiça"; portanto, é necessário, sim, tentar compreendê-lo melhor a fim de bem interpretar a norma (ou construir a norma, como seria possível dizer a partir do Realismo Jurídico e da Hermenêutica Gadameriana).

De fato, nota-se, no texto advindo em 1988, que a Justiça é explicitamente colocada como um dos objetivos principais do Estado Brasileiro (Art. 3º, I), bem como critério de avaliação na sua relação com particulares [da indenização por desapropriação pelo Estado (art. 5º, XXIV; art. 182, §3º; e art. 184)] e em certas relações entre os próprios particulares [causa de rompimento unilateral do contrato de trabalho (art. 7º, I)].  Além disso, a Justiça Social é galgada a critério fundamental de avaliação da Ordem Econômica (art. 170) e da Ordem Social (art. 193). Implicitamente, como forma de Justiça Distributiva, também aparece nas ordens para que o Estado erradique a pobreza e reduza as desigualdades sociais e regionais (art. 3º, III) e na indicação das prestações da Seguridade Social (art. 194, par. único, III).

Com o advento do pós-positivismo (ou neoconstitucionalismo), que atualmente já é quase uma unanimidade no Direito Constitucional brasileiro, supera-se a redução da justiça à lei formal, para incorporá-la abertamente também ao ordenamento, em especial o Constitucional. Além disso, dentro desta nova visão do Constitucionalismo, os princípios abertos também são normas obrigatórias. Com isso, os critérios de Justiça já não são algo externo ao sistema, mas sim internos e integrantes do ápice.





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Observações finais: Uma variante desta discussão é levantada por Amartya Sen, para quem em vez de se estudar uma Teoria da Justiça numa abordagem transcendental ("o que é uma sociedade justa?"), defende que se deve fazer uma abordagem comparativa, isto é, estudar "como reduzir as injustiças manifestas?". Em outro trabalho chamado "Por que Estudar Justiça?" (capítulo de livro que está no prelo), discuto o tema em co-autoria (Desirré Bollmann) abordando com mais profundidade a discussão em torno da proposta de Amartya Sen.

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